Perspectivando uma nova economia solidária, no seu último livro “DAR”, Bill Clinton reformula o sentido do acto, através de um olhar inspirador na forma como cada um de nós poderá mudar o mundo. Antes disso, Jorge Luís Borges pediu que se lançassem pérolas a porcos, porque o que importa é dar. Muito embora reconheça um quê de liberdade poética nesta proposta há algo que eu confirmei na rua; tudo o que dei é meu, tudo o que dei contínua comigo. Assim, no final tudo o que restará será o que compartilhei. Manterei este mesmo sentimento relativamente ao que simplesmente comprei ou vendi? Para que isso aconteça talvez seja necessário às empresas uma nova transparência de propósitos, novos valores, um novo enfoque relacional, refiro-me à criação de comunidades de proximidade real.
Madre Teresa afirmava que quanto menos temos mais temos para dar. Na rua vemos isso claramente. Parece um contracenso, mas não o será se repensarmos o sentido do que é verdadeiramente importante para a vida humana. Bastará ver como a satisfação em torno do consumo é fugaz, temporaria, para entender o valor real de um sorriso, ou de um abraço sincero.
Apesar de se tratar de uma visão meramente pessoal, acredito que todos teremos a agradecer o facto de poder dar o melhor de nós próprios. Mas, quantos de nós estamos dispostos a isso?! Uma nova consciência para o mundo dos negócios terá, necessariamente, que passar pela responsabilidade de, como diria Ghandi, sermos o exemplo que queremos ver nos outros. Mais uma vez dar, neste caso dar o exemplo.
Aceitar a dádiva como forma de participar na construção de um mundo onde todos tenham lugar é um sentimento que está em qualquer de nós, independentemente do credo que escolhemos. Para os judeus a caridade é uma responsabilidade da comunidade. Para os católicos toda a humanidade tem direito ao usufruto dos bens. O mundo islâmico dá o exemplo através do zakah, entregando 2,5% do lucro aos mais pobres, ainda para os muçulmanos só a caridade purifica o lucro obtido. Para os hindus o Homem veio ao mundo de mãos vazias, regressando sempre de mãos vazias, dar é para estes a única forma de purificação, pelo que só as acções filantrópicas darão bom karma. Igualmente, o desapego aos bens materiais da filosofia budista faz com que qualquer acção tenha como intenção gerar felicidade aos outros e a si próprio.
Todos pretendemos vencer. Para os que estão na rua isso significará sempre, quanto a mim, a vitória sobre si mesmo. Este é, igualmente, um desafio para o qual muitos dos nossos administradores de empresas não estão, ainda, preparados.
Será previsível um crescimento de mercado no que à solidariedade diz respeito. Para além de assegurar a sobrevivência básica dos mais necessitados, surgirão novas responsabilidades. Desde logo dar a si mesmo, ou à sua fonte de inspiração, abrindo caminho a um maior compromisso com a espiritualidade, na senda de modelos de aplicação não periférica à responsabilidade de se ser humano, passando a cumprir compromissos estratégicos baseados em valores essenciais à solidariedade, à responsabilidade inclusiva, à compaixão, à espiritualidade, ao estar grato, à paz interior. Esta será a oportunidade que faltava para o surgimento de uma nova economia.
Pensem nisto por uns instantes...
Texto adaptado por
Alberto Miguel