Clube dos Poetas Mortos

Vivemos hoje numa sociedade onde a massificação e a instantaneidade emergem em todos eixos da actividade humana. A globalização trouxe alguns benefícios, mas arrasta consigo grandes problemas. A acção educativa tem um papel fundamental na mudança de paradigmas e mentalidades. Viver hoje na sociedade global é um desafio constante para os governantes, governados e acima de tudo para os educadores.

Na minha análise, e tendo em conta a importância da relação pedagógica, decidi comentar o filme que me inspirou: “clube dos poetas mortos”. Esta ficção baseia-se na história de um professor de literatura e da relação que ele constrói com os seus alunos, num colégio elitista, de regras frias e rígidas. As suas aulas são dadas de forma pouco ortodoxa aos olhos dos regulamentos, mas ele busca em cada momento de formação, proporcionar aos alunos a liberdade de pensamento e expressão, que colidem frontalmente com as regras do colégio. Ele constrói com a cumplicidade de alguns alunos, o gosto pela poesia, apela ao pensamento superior, à liberdade e à essência do próprio ser.

Observei o princípio da acção educativa, como uma exigência ontológica, que tem como fundamento transmitir, ser, levar e ajudar o outro a ser. Este educador, usou a sua sabedoria, pois colocou os seus conhecimentos científicos, pedagógicos e profissionais, ao serviço da formação humana e pessoal dos educandos. Este controverso professor, tem como objectivo ensinar aos alunos a compreenderem o valor da vida, o despertar para o seu “eu” e a descoberta do ser, a diferença entre o viver e existir. Não foi fácil o caminho, mas em cada um dos seus alunos, conseguiu mudar mentalidades, faze-los entender que do saber para a sabedoria existe um salto qualitativo, ontológico que instala o homem num outro mundo de conhecimento. A resignação e a aceitação das regras sociais, viver a vida como acontecimento biológico em vez de valor existencial, são interrogações que ele, de forma subtil potencia nos alunos. Quer que eles pensassem como sujeitos de existência e não apenas como sujeitos de vida. “Carpe Diem” é o lema das suas mensagens. “Vivam a vida para quando morrerem, não sentirem que se esqueceram de viver.”

Nesta ficção foi notável a importância da relação pedagógica que o educador construiu, mostrando nitidamente que mais do que saber ou conhecimentos, o educador necessita de sabedoria. Coménico definiu “a escola como oficina da humanidade e o educador como oficial da humanização”.

O saber e a sabedoria são realidades cognoscitivas diferentes, sendo o saber algo que se tem e a sabedoria algo que se é. A sabedoria faz agir. Transforma e eleva o homem e o mundo onde ele reside. O educador deve desenvolver a acção para a transformação do homem como ser consciente, com sentido, conduzida por uma pedagógica ciencial, mas terá que induzir este, numa esfera maior de uma pedagogia sapiencial.

O homem age e a sua acção afecta o mundo. O mundo globalizado, caracterizado pelo consumo exagerado, a produção em massa, os interesses económicos, estão a deixar o mundo esgotado e vazio. Os solos, o mar, o ar, os animais, as plantas, em suma todos os seres vivos estão a ser manipulados, transformados, aniquilados pela acção humana por um lado e pela inacção deste, por outro. Deixam lugar ao nada. E o homem deve recusar o nada e reivindicar o ser…o ser em consciência, dignidade, liberdade, justiça, liberdade e amor.

A natureza é dócil à acção do homem, deixa-o transforma-la, mexer, intervir, pensar, conceber e ensaiar projectos de domínio universal, cósmico. A acção humana é irreversível; é perene. O homem age e nessa acção provoca grande destruição.

A acção da irreversibilidade e da perenidade exprime o valor da acção: valor cósmico e comunitário. No cósmico a mínima acção do homem modifica o cosmos e no comunitário porque são graves as consequências da acção humana sobre a vida num todo e a na sociedade onde estamos inseridos. Todas e quaisquer acções humanas, afectam de forma global, sejam elas construtivas ou destrutivas.

Desde os tempos remotos que os grandes filósofos defendem o valor do homem como ser, advogando a que a sabedoria é inseparável da existência. Mas continuará o homem a existir, se não tomar consciência do valor da sua existência?

A contemporaneidade do nosso tempo, marcada pela globalidade e hegemonia económica, só se interessa pela sabedoria se esta for um bem económico, comercializável e lucrativo. “O paradigma científico-tecnológico, pressupõe esta realidade, banindo a sabedoria face a uma ciência que ocupa por inteiro, absolutamente, o espaço do saber.”

Mas o homem precisa mais do que a ciência e a tecnologia para se realizar, precisa das formas tradicionais do saber, quer e deseja ser. O homem precisa de aprender. Heidgger definiu: “Aprender quer dizer: fazer com o que fazemos e não fazemos seja o eco da revelação do essencial, sempre, todas as vezes…”

E, olhando com alma para este pensamento filosófico, faço dele as minhas palavras. O educador e a acção educativa, podem e devem fazer aprender a amar e respeitar o cosmos e a vida.

Filomena Gonçalves